Desenrolar Brasil, vale a pena?

Brasileiros endividados têm a chance de renegociar suas dívidas no programa “Desenrola Brasil”, que o governo federal acaba de lançar. Mas como funciona esse programa? Quais são as dicas e os alertas, segundo especialistas?

Neste texto vamos explicar, em quatro pontos, o “Desenrola Brasil” e como ele pode afetar a vida de milhões de consumidores. Antes, algumas informações importantes. As dívidas que podem ser renegociadas são as contraídas entre 2019 até 31 de dezembro de 2022.

No total, o governo diz querer que 70 milhões de brasileiros fiquem com o nome limpo e tenham a chance de renegociar os valores que estão devendo. O programa estava previsto para começar em setembro, mas foi antecipado para estimular o consumo e tentar aquecer a economia neste segundo semestre. Vale lembrar que o Brasil vive hoje um nível recorde de endividamento: de cada 100 famílias, 78 estão com alguma dívida.

Bom, o que está sendo lançado agora é a primeira fase do “Desenrola”. E ela tem dois públicos principais neste momento. O primeiro são aqueles que ganham até 20 mil reais por mês e tenham dívidas de qualquer valor. Essas pessoas poderão entrar em contato direto com os seus bancos e tentar renegociar ou parcelar suas dívidas, em até 12 meses. As condições de negociação, como número de parcelas e taxas de juros, vão depender de cada banco.

Para incentivar as instituições financeiras a participarem do programa, o governo disse que vai dar estímulos regulatórios e, nas palavras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “assumir a responsabilidade de negociar com os bancos”. O segundo público dessa primeira etapa é composto de um milhão e meio de brasileiros que hoje têm dívidas pequenas, de até cem reais. Essas pessoas vão, automaticamente, ficar com o nome limpo, ou seja, poderão voltar a pegar crédito ou fazer um contrato de aluguel, por exemplo, sem que a dívida atrapalhe isso. Mas atenção: elas ainda vão ter que pagar a dívida, que não vai ser perdoada. Caberá a cada consumidor entrar em contato com seu devedor para resolver o pagamento.

Em setembro, começará a segunda etapa do “Desenrola”, atendendo um público mais amplo. É quando serão renegociadas as dívidas da chamada faixa 1, que são os brasileiros que ganham até dois salários mínimos ou que estão no cadastro único de programas sociais do governo e têm dívidas de até cinco mil reais. Vai ser também a oportunidade de pessoas renegociarem dívidas de contas de energia, internet ou celular, por exemplo. Essa segunda fase vai ser feita por meio de um aplicativo, é nele que o consumidor vai checar as propostas dos credores.

Nessa etapa, será maior o incentivo para as instituições financeiras renegociarem com os devedores. Isso porque essas negociações estarão garantidas pelo Fundo Garantidor de Operações, o FGO – que, na prática, vai assegurar ao banco que ele receberá parte do dinheiro, mesmo que a dívida renegociada não seja completamente paga pelo consumidor. E para o consumidor endividado, vale a pena aderir ao programa? O meu colega Felipe Souza conversou com a economista Izis Ferreira, da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. Ela acha que é na segunda fase, a partir de setembro, que, sob a garantia do FGO, os bancos terão a capacidade de oferecer condições melhores de renegociação.

Dito isso, ela aponta que renegociar as dívidas é, de fato, a melhor opção para voltar a ter as contas em dia e ficar com o nome limpo. Mas quem aceitar participar dessa negociação tem que ter em mente que vai ser crucial pagar as parcelas renegociadas pelo “Desenrola”, sob o risco de ter muita dificuldade em voltar a ter crédito caso as dívidas não sejam quitadas. Mesmo que a sua instituição financeira ainda não tenha aderido ao “Desenrola”, ou que a sua dívida só se enquadre na segunda etapa do programa, vale a pena já ligar para o banco e perguntar que tipo de condições ele oferece para a renegociação, segundo a economista.

Outra opção é fazer a transferência da dívida para outra instituição que esteja participando do “Desenrola”. De qualquer modo, considerando que os juros vão fazer a dívida continuar crescendo, a Izis Ferreira acha que quanto antes o consumidor conseguir renegociar suas dívidas, melhor. Nas palavras da economista: “O sobrenome é o único ativo do brasileiro. Ficar com ele sujo traz transtornos inclusive psicológicos. Ele não consegue nem alugar um imóvel caso precise mudar. A opção é alugar no nome de um terceiro. (…) Isso cria uma dependência e insegurança enormes, que impactam na vida pessoal e até no trabalho”.

Tem outro ponto importante levantado pelos economistas: mesmo com a possibilidade de renegociar, é preciso tomar cuidado para o consumidor não entrar em novas dívidas, mais do que seja capaz de cumprir. O que isso quer dizer? Primeiro, que, na prática, vale a pena para o consumidor aproveitar o “Desenrola” para tentar barganhar com o banco por prestações que caibam no orçamento e sejam factíveis de serem pagas. Segundo, que, ao ficar com o nome limpo e com a possibilidade de obter mais crédito, o consumidor tem que tomar muito cuidado para não acabar assumindo novas dívidas que não conseguirá pagar no futuro.

É por isso que a Izis Ferreira diz que o governo precisaria fazer, também, uma campanha nacional mais ampla de educação financeira em paralelo ao “Desenrola”, para estabelecer um consumo, nas palavras dela, sustentável e racional dentro de cada orçamento familiar. Com isso eu fico por aqui, mas conta

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *