Por que moeda comum entre Brasil e Argentina não enterraria real

Esses termos ganharam os holofotes por causa dos planos de uma moeda comum para Brasil e Argentina anunciados pelo presidente Lula

O que nós estamos tentando trabalhar agora é que os nossos ministros da Fazenda, cada um com sua equipe econômica, possam nos fazer uma proposta,  de comércio exterior e de transação entre os dois  

países, que seja feito numa moeda comum a ser construída com muito debate e muitas reuniões.

Eu sou Nathalia Passarinho da BBC News Brasil e neste vídeo explico o que está em discussão.

Essa proposta de moeda comum envolve a criação de uma moeda para ser usada, primeiramente, apenas no comércio entre Brasil e Argentina

Depois, poderia ser expandida para uso em outros países da América do Sul, se houver esse interesse.

Aqui a diferença crucial: ela não se tornaria uma moeda única, como  é o caso do euro, adotada em 20 países da Europa, ou seja, não substituiria o real, moeda do Brasil, nem o peso, a moeda da Argentina.

No dia a dia, não iria para a carteira ou nossas contas bancárias pessoais

Se é assim, para que serviria então uma moeda comum?

Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a intenção é facilitar a compra e venda de produtos entre os dois países, sem a necessidade de recorrer ao dólar – que é a moeda padrão das transações comerciais internacionais Por causa dessa padronização, vigente desde 1944,  muitos Bancos Centrais do mundo inteiro mantêm  parte da riqueza de seus governos em dólar.

O Banco Central do Brasil tem hoje uma reserva de 326 bilhões de dólares,  

muitíssimo maior que a da Argentina, que é de mais ou menos 38 bilhões de dólares, parecem valores estratosféricos, mas  eles servem como uma espécie de seguro  para garantir o pagamento das dívidas  e transações internacionais dos países

Dito isso, existem experiências de comércio internacional sem o dólar.

A China, por exemplo, faz tratados bilaterais para comercializar na sua moeda, o iuan, com isso, ganhou espaço, por exemplo, no comércio com a Rússia, que foi forçada a diminuir suas transações em dólar por causa das sanções econômicas relacionadas à guerra da Ucrânia.

Mas, de modo geral, quando os países têm poucas reservas em dólar,

como é o caso da Argentina, fica mais difícil participar do comércio internacional.

Um dos problemas é que o peso é uma moeda de baixa aceitação no mercado global, ou seja, é muito difícil trocar ele por dólar para então fazer comércio

A moeda comum faria esse papel e funcionaria, na prática, mais como uma moeda virtual, do que a moeda que a gente usa no dia a dia.

Ao simplificar e aumentar o comércio bilateral, os governos de Brasil e Argentina argumentam que conseguiriam abocanhar parte de um mercado que foi  perdido, principalmente, para produtos chineses.

Vale lembrar que a Argentina é o terceiro maior  

parceiro comercial do Brasil, atrás de Estados Unidos e China.

E um grande importador dos nossos produtos industrializados, principalmente do setor automotivo.

O comércio entre os nossos dois países caiu cerca de 40%, e não foi por razões competitivas.

Não foi pelo fato de que os argentinos deixaram de pretender comprar produtos brasileiros, ou brasileiros deixaram de pretender comprar produtos argentinos.

O comércio caiu por uma situação que não foi enfrentada, que é estabelecer 

um tipo de parceria dada a conjuntura que permita à Argentina voltar a comprar, ao Brasil voltar a comprar, e restabelecer, se  não o patamar recorde do nosso comércio exterior, pelo menos recuperar uma parte desse tempo  e recursos ao longo dos últimos dez anos essa ideia já tinha sido defendida por  Haddad e pelo economista Gabriel Galípolo, hoje número 2 do ministério da Fazenda, em um  artigo para o jornal Folha de S.Paulo em 2022 eles propunham criar um Banco Central  sul-americano responsável por emitir  a moeda comum – que, segundo eles, fortaleceria a soberania monetária  dos países da América do Sul, já que tiraria o dólar da jogada.

Como a proposta é muito embrionária,  tem muita pergunta ainda sem resposta:  

por exemplo, quem emitiria tal moeda, como  seria estabelecida a sua cotação, ou como fariam na prática os empresários brasileiros  que exportam ou importam da Argentina.

Imagina-se que, no caso de a balança comercial do Brasil com a Argentina  

ficar deficitária – ou seja, os nossos vizinhos comprarem de nós mais do que  

venderem -, o déficit deixaria de ser em  dólares, e passaria a ser na moeda comum.

Defensores da proposta acham que o Brasil tem a chance de aumentar suas exportações para a Argentina, mas os críticos do projeto até agora dizem que  ele tende a favorecer menos o Brasil, e mais a Argentina – que é quem tem reservas baixas de dólares e dificuldades de captar essa moeda.

Além disso, a Argentina já tem uma economia bastante dolarizada, ou seja, o dólar é usado para várias transações internas, ao contrário do Brasil.

Sair dessa dependência provavelmente daria bastante trabalho. Críticos dizem também que ainda não está  claro quais vão ser os benefícios para  o Brasil de apostar mais no comércio com um país em situação de crise como a Argentina,  nem de onde sairia o lastro da nova moeda.

Simplificando, de onde virá a garantia de que a moeda será confiável para fazer as transações o governo brasileiro diz que haverá mecanismos que sirvam para garantir que as transações com os argentinos não sofrerão nenhum tipo de calote.

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